16.1.07

Para uma desconhecida

Este post de hoje é para uma desconhecida, que me deixou lágrimas na mão.
Ia, vagarosamente, do Saldanha para o Campo Pequeno, quando vi, sentada na soleira da porta de um prédio grande, uma rapariga com lágrimas nos olhos, uns cadernos e caneta na mão. Vinte, vinte e poucos anos. Parei, olhei-a e perguntei:
- Então, o que se passa, sente-se mal?
O choro passou de lento a convulsivo.
Só soube afagar-lhe o cabelo, levantar-lhe o queixo e dizer-lhe umas poucas palavras.
Na minha mão direita havia lágrimas suas.
Não lhe resolvi nenhum problema. Mas talvez a tenha convencido de que o mundo e a vida não são tão maus, como em alguns momentos nos parecem. Talvez a tenha convencido de que ser tão nova e tão bonita é uma razão para não desesperar tão profundamente. Porque a juventude também é feita de força e de esperança.
Talvez…
Porque, nas ruas da cidade grande deambulam muitas solidões, dedico a esta rapariga e a outras mulheres que o queiram para si, este poema de Sophia:

Aquelas cujos ombros se extinguiram
Contra os muros dum quarto misterioso
Onde há uma janela voltada para longe

Aquelas em cujos olhos não há cor
À força de fitarem o vazio
Que vai e vem entre os horizontes e elas

Aquelas cujo desespero cai
De todo o céu a pique sobre a terra,
Imutável e completo, igual
Ao silêncio do mar sobre os naufrágios.

Elas são aquelas que esperaram
Que todas as promessas se cumprissem
E que nos cegos deuses confiaram.

4 Comments:

Blogger antónio paiva said...

..................

a falta de algo como ponto de referência, leva-nos muitas vezes a lugares sombrios da vida

a naufrágios que criamos, para nós e para os outros

assim é, somos frágeis muito frágeis, mesmo que a imagem que criamos, queira muitas vezes fazer parecer o contrário

sejamos nós homem ou mulher

bonitos ou feios

ter remos, não significa saber remar

haver mar, não significa sabermos navegar

há muito para aprender

falta-nos é humildade para o querer

..................

Beijinhos e noite serena

January 16, 2007  
Blogger Maria Arvore said...

No meio da multidão é onde se está mais sozinho porque ninguém nos conhece. E Lisboa está inundada de gente que não tem ninguém para desabafar porque não se cria intimidade que o permita.
E nem todos temos a tua disponibilidade de reparar nos outros que estão ao nosso lado da rua, para fazer renascer a esperança de que as pessoas ainda são humanas.

January 16, 2007  
Anonymous Anonymous said...

Os deuses, sim. Bom dia.

January 17, 2007  
Blogger Ana said...

Nas palavras de chuvamiuda:

ter remos, não significa saber remar
haver mar, não significa sabermos navegar
há muito para aprender

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Continuo a tentar aprender. Na certeza de que sou ignorante.

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Obrigada a todos Vós, que me concedem o gosto de saber que vieram...

January 17, 2007  

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