5.3.07

Um frio


- E tu, Sara, porque choras? – Que tristeza é essa que te consome?
- Ando perdida de mim. Já não me conheço.
- Como assim? – Conheço-te eu. Conhecem-te tantas pessoas. Estimam-te.
- Conhecem um fantasma. O fantasma do que fui. Sou outra. Sou outras e não sei quem sou. Tenho uma idade na cabeça, outra no coração e outra na pele. O espelho mente-me. Não sou aquela pessoa que ele me devolve. O coração mente-me. Não sou aquela pessoa que ele finge animar. O pensamento mente-me. Não sou aquela pessoa racional e decidida que ele me quer impingir. Afinal, quem sou? – Restos. Restos destroçados do que fui. Naufrágio sem tempestade. Morte sem estertor. Grito sem som. Sou a senhora da agonia. Simplesmente. Delicada e suavemente caminhando na Terra do Nada.


(Extraído das folhas soltas, guardadas na escrivaninha)

8 Comments:

Blogger PintoRibeiro said...

Belo, belo, belo. Boa noite Tia, bjinho.

March 05, 2007  
Blogger bettips said...

Desabrocham
As folhas
A idade (que idade tinhas?)
Temos folhas, lâmpada que não se apaga...Gosto (já sabias...) Bjs

March 05, 2007  
Blogger pepe said...

Imagem forte: "sou a senhora da agonia", aquela que é quem não aparenta ser para si mesma. O drama inverso de Dorian Gray, mas muito mais trágico, porque sem culpa, nem proveito.

March 05, 2007  
Blogger Maria Arvore said...

Bonito e profundo. :))

E abrangente porque em alguma altura das nossas vidas somos a "senhora da agonia" (adorei esta imagem)como se desmontássemos um rádio e as peças não voltassem a encaixar.

March 06, 2007  
Blogger antónio paiva said...

....................

essa gaveta, essas folhas soltas

grandes tesouros

......................


Beijo e noite serena

March 06, 2007  
Blogger Bartolomeu said...

Mesmo quando o sol brilha
Sinto a chuva e o frio
Invadirem o meu coração

Mesmo que as nuvens
Já tenham desaparecido
Fica a mesma sensação

Mesmo que me mostres
A razão para lutar
Já não tenho aquela força

Quando olho as minhas mãos
E penso em sobreviver
Sinto que o mundo é uma farsa

Mas mesmo assim os teus olhos
Mantêm-me a esperança acesa
De encontrar a paixão

E mesmo que digas que não
São os teus lábios que falam
E nunca o teu coração.

March 06, 2007  
Blogger Bernardo Kolbl said...

Boa dia Tia.

March 06, 2007  
Blogger Ana said...

Quanto, quanto agradeço, que tenham a generosidade de achar que vale alguma coisa, aquilo que por aqui deixo escrevinhado!

March 07, 2007  

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